Quando clinicava, apareciam no meu consultório, pessoas dilaceradas, ocas por dentro, sem aquela esperança grudada na carne. Tudo era muito difícil para elas, seus comportamentos, complicados de serem modificados.
Depois da minha saída do consultório, percebo que ao me deixar mais disponível para ouvir os outros, encontro os mesmos problemas, as mesmas reclamações, as mesmas queixas.
Na maioria do tempo, são mulheres (talvez porque elas se abram mais). Mulheres neuróticas, ansiosas, tristes com seus relacionamentos, mulheres com medo da solidão e da morte.
Ontem, uma senhora não aguentou e começou a chorar ao me contar sobre a doença degenerativa do marido. E que ela não estava preparada para deixa-lo ir. Porque ele era seu suporte, sua pilastra, seu amigo, companheiro. E com sua morte, ela não encontraria sentido nas tarefas cotidianas da vida. Ela se questionava: Para que acordar cedo e ir trabalhar? Para que fazer isso e aquilo se somos finitos e vamos morrer? Qual o sentido disso tudo?
Será que não exageramos em procurar sentido na vida? Será que estarmos aqui, e nos relacionarmos, convivermos, proporcionarmos alguma felicidade e companhia não é o suficiente? Por que precisamos de mais e mais e mais? Me parece que o passado e os bons momentos vividos não são suficientes para nós, que por isso, procuramos desde bebida, jogos, drogas, igrejas para nos confortarmos com o fim.
Não seria mais fácil e delicado curtirmos o que a vida oferece aqui e agora? vento no rosto, mergulho no mar, abraço apertado, poesias, um vinho compartilhado com alguém que a gente goste e outras tantas coisas, que fazem da gente, exatamente isso, humanos.
Pode parecer simplista, mas como já cantou Marcelo Jeneci: a gente é feito para acabar. Então antes de acabarmos, aproveitemos como consiguimos. Fácil? Não. Mas vale sempre a tentativa.