quinta-feira, 11 de setembro de 2008

Meu encantamento e o texto dela


Impossível não me encantar por ela, porque ela é tão ela, e eu fico meio sem saber o que fazer com o olhar dela e os pedidos para que eu olhe nos seus olhos; só sei que minha respiração fica ofegante como se quisesse dizer que eu não aprendi a olhar muito bem, que meu olhar é tímido, olhar de lado, que faço de conta que não vejo, que aprendi a ter esse olhar meio blasè, meio bobo, meio qualquer coisa que não seja inteiro. E antes de me encantar pessoalmente, ela me manda um texto que escreveu e pede a minha opinião; não sou crítica literária, mas gosto de estórias e eu gosto do jeito que ela escreve, e ela me manda outro texto, e eu continuo gostando, e eu me pergunto se tem como me encantar mais. Vai saber...
E ela me deixa publicar no blog, e esse texto é dela:
"Crianças têm medo. Eu tinha também. Lembro-me como se fosse ainda hoje nós sentados -minha mãe, meus irmãos e eu - em frente a minha casa, na beirada do portão sob a noite. Conversas jogadas na rua, com quem por ali passasse. Falava-se do tempo, que contribuía para estarmos ali sentados debaixo daquela lua comum de interior; falava-se da morte de alguém de longe e de perto; ria-se pouco a vontade; especulava-se pela vida alheia; estórias comuns das cidades pequenas. Mas se alguém perguntava por nós, os filhos, ali já de pijamas agarrados nas pernas de minha mãe, minha avó ia logo falando de um por um e quando chegava em mim, a mais velha, emendava: "essa eu peguei na enchorrada!", e me olhava com olhos de quem ri de mim e brinca comigo, misturando àquele desdém da minha entrada para a família o amor que tinha por mim. Eu sofria muito por pensar que minhas origens estavam naquelas águas sujas que passam rápidas junto da calçada. Imaginava que tempestade havia me trazido. Calava-me e recusava-me perguntar mais sobre essa estória, com medo de minha avó resolver me contar, enfim, toda ela. Mas se, de volta para dentro de casa, eu dormisse antes de ir para o meu quarto, minha avó me carregava até a cama e, acordando durante o trajeto, percebia seus braços de carinho e o amor que me faziam dormir mais tranquila: aquela não poderia ser senão a minha avó. Entendia nesse momento o que ela queria dizer com aquele olhar de quem zomba e se diverte com a inocência da neta. Era jeito de amar divertido. Era jeito de amar com poucas palavras como era o costume de minha avó. Era o jeito de amar às vezes só corrijindo, para a gente ser boa gente quando crescesse... Era o jeito de amar que ela sabia.É o jeito de amar que eu percebo. Crianças têm medo, eu tenho também. Mas sua presença me encoraja."

2 comentários:

Anônimo disse...

Gente...o que aconteceu com a Helena?
Mara, v. é difícil...

Valentina disse...

Mais uma vez: felicidades.
Te amo muito.