sexta-feira, 30 de março de 2007

Freud: Gênio ou engodo?

Em "A verdade", uma postagem anterior do blog, eu quis ironizar um pouco a condição psíquica dos que estudam e trabalham para analisar as pessoas que chegam em seus consultórios. Mas quis também mexer com a imagem social que os psicólogos são pessoas normais e bem resolvidas, uma postura que se vende para muitos, mentira das boas.
Partindo do pressuposto que psicólogos são gente, e gente têm problemas, os psicólogos também têm. O que difere então eles (no caso eu sou da categoria) e os outros?
Partido de outro pressuposto, de que além de psicóloga, sou também psicanalista, ficarei com o embasamento criado pelo velhinho de charuto. A Psicanálise existe há mais de 100 anos e mesmo não sendo catalogada como "ciência" por falta de um objeto de estudo positivo, observável e experimental, funciona. Se não funcionasse por que ainda estaria no "mercado"? Se não podemos constatar sua eficácia nos laboratórios, podemos verificar seu sucesso com a melhora psíquica daqueles que se deitam no divã.
Só que ultimamente a Psicanálise tem sido alvo de muitas críticas, no caso mais recente os livros "Mentiras no divã" (ficçional) e "O Livro Negro da Psicanálise" (livro que pretende ser um documento histórico) são exemplos disso. Ok, a teoria criada por Freud não é perfeita, longe disso, foi posta a prova por outros psicanalistas e melhorada com o tempo. Mas antes de ser funcional e pragmática, a Psicanálise tem uma importância histórica que muitos esquecem ou desconhecem: Freud conseguiu livrar o homem da barbárie humana e ao mesmo tempo foi convicto do papel que o Homem exerce na sociedade.
Freud pensou em sua teoria como uma ferida ao ego do Homem, e o tirou de uma pretensa posição de centralidade e privilégio no mundo. Ele ofendeu a megalomania humana e procurou provar ao "eu" que ele não é senhor nem mesmo de sua própria casa, devendo, porém, contentar-se com escassas informações acerca do que acontece inconscientemente na sua vida. Sendo assim, na perspectiva freudiana, toda ação humana pode ser tomada como sintoma, ou seja, como expressão de um outro sentido distinto, do imediato não apreensível imediatamente. (Será que só eu acho genial isso?)
Se me pedissem para definir a Psicanálise em uma frase diria que ela é a arte da interpretação.
Posso até estar sendo bastante imparcial, mas na minha humilde opinião, esse cara que muita gente critica foi uma dos maiores gênios da História da humanidade.
O que difere um psicanalista que certamente tem seus problemas particulares e os outros é que um deles tem a chave para essa interpretação.

Obs: Gean, espero que pelo menos parcialmente, eu tenha colocado o meu ponto de vista sobre a sua questão.

terça-feira, 27 de março de 2007

Acontecimentos

Fui passar a tarde na casa de uma grande amiga. Se me perguntassem o que a gente fez durante as horas, diria que tomamos café, comemos bolo e conversamos. Alguns me diriam que foi então uma tarde comum.
Depende do ponto de vista. Percebi ao passar dos anos que pode se viver uma vida com determinadas pessoas e nada aprender, compreender ou fazer sentido. Mas algumas pessoas são ilustres - não por seus títulos, tenho certeza que minha companheira da tarde poderia ser tão interessante mesmo se não possuísse um diplominha de doutorado - mas porque fazem de algumas horas uma experiência única.
A identificação com alguém é essencial; pra mim, não basta ter beleza, dinheiro ou poder. Elas precisam ser responsáveis para com a amizade e serem inteligentes ao ponto de trocarem experiências.
Conversamos um pouco sobre Madame Bovary de Flaubert e agora me vem à cabeça um trecho do livro que diz mais ou menos que Ema esperava no íntimo, um acontecimento qualquer, como marinheiros em perigo, procurando, ao longe, alguma vela no horizonte. A protagonista de Gustave Flaubert não é tão diferente das mulheres (e homens) da modernidade. Nós queremos sempre acontecimentos e alguém para nos segurar quando a maré estiver braba.
Só que para alguns, o acontecimento tem que ser noticiado em todas as colunas sociais, ou, algo que beire o inacreditável e impossível.
Eu me satisfaço com risadas de contentamento por uma divergência de idéias, de uma crítica à dois sobre um livro, uma música, um filme. Uma troca de paixões por existências que faz da nossa existência algo mais leve, mais suave, mais feliz.
As vezes a felicidade está na simplicidade das relações que tanto tentamos complicar.
Obrigada por sua existência Danielle.

Obs: Isso serve também como uma declaração de amor e carinho.

domingo, 25 de março de 2007

Verdade

A verdade é que eu nunca encontrei um psicólogo que fosse bom da cabeça; acho que é isso, a gente se diverte para ver quem tem a cabeça mais pirada que a nossa. Reconfortante...

É tudo por hoje.

quarta-feira, 21 de março de 2007

Breve Comentário sobre o Cinema

Uma amiga, Dra. Danielle Corga, me enviou um e-mail dizendo que havia lembrado de mim por ter lido uma notícia da - agora - good girl, Angelina Jolie. Meus amigos são em sua maioria assim, se lembram de mim através da arte, do cinema principalmente, e focando ainda mais, nos meus gostos exagerados por determinados atores.
Eu sei que eu sou uma deslumbrada pela sétima arte, e sei que o cinema me proporciona assistir elementos de vida que eu não conseguiria ou não poderia viver. O cinema dá a impressão que pode tudo. E eu embarco totalmente! Tô dentro sempre, sempre, sempre!
Salve salve Angelina, Connelly, Kate, Jodie, Norton, Nicholson, Watts, Penélope, Sean e outros tantos que fazem a vida ficar mais doce e amarga. E isso já me lembrou uma frase de Vanilla Sky...

segunda-feira, 19 de março de 2007

Por Uma Vida Menos Ordinária

Alguns teóricos - filósofos, psicólogos e pensadores em geral - denominaram uma nova "patologia" para o sujeito da Modernidade, chamada de normose.
Se não bastassem os neuróticos, os psicóticos e os perversos, agora, em escala alarmante, temos os normóticos. A normose pode ser definida como um conjunto de normas, hábitos, valores e estereótipos que permeiam o modo de pensar e de agir do sujeito moderno. São valores aprovados pela maioria acarretando sofrimento, doença e morte, sem que tais sujeitos tenham consciência.
A verdade é que ser muito "normal" e seguir todas as regras sociais também não está valendo para o sujeito perdido nos dias de hoje. Nem todas as regras e leis são benevolentes, algumas são geradoras de enfermidades, mas como são adotadas por muitos que não se questionam a razão de determinados conceitos, esses muitos não se dão conta do seu caráter patogênico.
Ironicamente, e consequentemente, a normose é uma normalidade doentia e alienante. Uma necessidade de, a todo custo, ser como os outros, agir como os outros, pensar e sentir como os outros, enfim, ser o outro.
O desejo próprio desaparece, os homens já não escutam as suas próprias preces, eles rezam a prece do outro (a prece que foi convencionada pela sociedade, claro).
Não é novidade que pertencer à minoria é tornar-se vulnerável, é expor-se a crítica, a história está aí para confirmar o que acontece com aqueles que querem de alguma maneira mudar o sistema em que pertencem. Utopia? Bem provével, mas ideologia é bom e não dá câncer.
Sejamos diferentes daquilo que se convencionou "normalidade", afinal, tenho certeza que as pessoas interessantes que conhecemos são aquelas que não estão ligadas à convenções medíocres de uma vida ordinária que nos acostumamos a levar.

"O ser humano plenamente saudável é santo. Então, é como se estivéssemos diante de um objetivo quase inatingível. O santo está em nós potencialmente. É preciso despertá-lo". Jean Yves Leloup.

"Precisamos de algumas pessoas malucas; vejam só para onde as pessoas normais nos levaram..." George Bernard Swaw.

quinta-feira, 15 de março de 2007

O Choro de Kate

Assisti uma entrevista no "Inside Actor´s Studio", onde a convidada da vez era a atriz britânica Kate Winslet. Quem me conhece sabe que admiro seu trabalho e que Kate é pra mim uma das maiores atrizes da atualidade. Mas essa entrevista superou minhas expectativas sobre a "pessoa" Winslet.
Interrogada sobre o marido, o diretor Sam Mendes, com quem é casada há alguns anos, Kate começou a chorar compulsivamente ao responder que ela era uma garota de sorte. Quando se acalmou, a atriz pediu desculpas, mas a verdade é que ela não precisava ser desculpada, mas aplaudida de pé. Por que?
Na maioria das vezes choramos pelo amor perdido, ou por aquela paixão não correspondida. Choramos de dor, de saudade, com angústia, sentindo-nos vazio. E normal que isso ocorra, afinal o amor não pode ser explicado racionalmente. Mas, poucas vezes choramos de felicidade por estarmos com a pessoa amada, por, enfim, ter encontrado aquela pessoa "que nos completa", que nos faz feliz. Por que guardamos as lágrimas apenas para os maus momentos? Por que chorar virou sinônimo de tristeza? Quantas vezes choramos por alegria, contentação, superação? Pouquíssimas.
Talvez tenhamos medo de parecermos ridículos, deslumbrados...
A verdade é que Kate Winslet mostrou para àqueles que assistiram à entrevista que é possível chorar sem se envergonhar e sem medo de ser patético. Que possamos seguir o exemplo da atriz britânica e chorarmos por estarmos "simplesmente" felizes.

terça-feira, 13 de março de 2007

Procura Equivocada

Me relacionando a maior parte do tempo com pessoas, sejam elas no consultório, ou na sala de aula, me dei conta que o sofrimento é puramente egocêntrico. E por que não deveria ser? Algum sábio já disse que a minha dor é pior porque ela é minha.
A demanda por especialistas na área de Psicologia tem crescido, assim como outras especialidades. Tudo que possa curar ou amenizar a dor psíquica tá valendo, desde livros de auto-ajuda, passando por religiões diversas até massagem relaxante. O grande problema é que todos os truques não estão funcionando. As pessoas continuam sofrendo. O remédio não faz mais efeito, a terapia é cara, os exercícios de respiração duram por uma semana, a bebida só dura por uma noite e no outro dia somos abençoados com a enxaqueca. Que mais podemos fazer?
O que talvez não compreendemos é que não é só a nossa dor que é egoísta, somos egoístas por inteiro. As relações humanas vão de mal a bem pior; me relaciono com uma pessoa que eu nunca vi pela internet, mas não consigo bater cinco minutos de conversa com meu vizinho. Consigo ficar horas na frente de uma televisão, mas não consigo abrir um livro. Não me interessa um relcionamento sério, mas quantos eu beijei a noite passada, cultura virou entretenimento, inteligência virou superficialidade, divertimento acabou quando o jogo do Corinthians e Palmeiras chegou ao fim, e só nos reunimos como pátria em copa do mundo e carnaval. O que sobrou da gente? Que valores nos foram deixados?
Eu cobro do outro o que eu não consigo efetivamente oferecer, assim, acabam-se namoros, amizades e casamentos. Sobra solidão com vista para o mar (para os privilegiados) ou para a favela do lado. Quero que entendam a minha dor, mas não suporto ouvir as lamúrias do meu melhor amigo que me acostumou mal (oras, ele era tão engraçado na mesa do bar). Queremos sempre o que não oferecemos e depois lamentamos pelo copo derramado (de cerveja, claro).
Mas a cura para o mal não está no outro ou no externo, já que podemos dizer, com enorme conhecimento de causa, que o outro ou o externo são passageiros; o nosso enorme mal estar vem do sentimento de que este corpo tem alma, a náusea que sentimos é por sabermos que estamos sós, por mais acompanhados que possamos estar.
Se a solidão é humana, puramente humana, por que ainda morremos de medo da sua companhia diária? Por que tentar amenizar (pura tentativa equivocada) com sedativos que duram apenas alguns dias, algumas horas? A pergunta é: por que não ir mais fundo?

domingo, 11 de março de 2007

Nine

O músico irlandês Damien Rice lançou a pouco seu novo disco, "Nine", sucessor de "O" que se tornou famoso especialmente pela música incluída na trilha do filme de Mike Nichols, "Closer". Mas não foi a canção original (The Blower´s Daughter), cantada por Rice que ficou famosa aqui no Brasil, e sim suas duas versões horrorosas em português, uma na voz de Ana Carolina e Seu Jorge e outra pior feita por Zélia Duncan e cantada por Simone. Blá...
Mas diferente de "O" que obteve críticas positivas unânimes por todo o mundo, "Nine" desagradou alguns. Ainda não entendi porquê. O disco conta com 10 faixas, e assim como o disco anterior, as músicas vão de um suspiro para um berro em questão de segundos. Passa a sensação de um desespero total e absoluto. A música de trabalho "9 Crimes" é dolorida, especialmente quando a parceira de Damien, Lisa Hannigan canta.
Parece que a intenção do cantor/compositor em realizar um disco mais pesado não se concretizou, como ele mesmo afirmou mais tarde. As guitarras mais pesadas ficam por conta da "Me my yoke and I".
Mas o que me fez pensar para escrever sobre o disco de Rice, é o por que do meu enorme encantamento com suas músicas, e cheguei numa conclusão que até agora me satisfaz. As letras do compositor parecem livres-associações, não são lineares, não há um interesse em soar eloquente. É como se ele tentasse se desfazer de todas as suas censuras e escrever sobre tudo aquilo que lhe vem à cabeça: "Você pode me manter preso, é mais fácil de provocar, mas você não consegue pintar um elefante tão bem como ela", ou "Me leve para fora junto com o lixo, isto não é o que eu faço, é o lugar errado para eu pensar em você".
Além disso tem duas belíssimas canções que não precisam de tradução, precisam apenas de um pouco de sensibilidade: "Elephant" e "Accidental Babies". Nota 9,5, quase 10.

"
What's the point of this song? Or even singing?
You've already gone, why am I clinging?
Well I could throw it out, and I could live without
And I could do it all for you
I could be strong
Tell me if you want me to lie
'Cause this has got to die"


Falando em Saudade

Oh, pedaço de mim
Oh, metade amputada de mim
Leva o que há de ti
Que a saudade dói latejada
É assim como uma fisgada
No membro que já perdi – Chico Buarque

O poeta sempre fala melhor...

sábado, 10 de março de 2007

Os Outros e Eu.

Cada qual com seus gostos, podem ser eles: estranhos, acessíveis, absurdos, bizarros. O fato de não aceitar os interesses dos outros, só mostra a intensidade de algo que queremos negar, esconder, boicotar em nós mesmos. Sempre escondemos algumas de nossas afeições, seja de alguns amigos, da família, ou da sociedade em geral, justamente para continuar pertencendo a esses grupos.

O sentimento de pertencer é urgente, é gritante e berra a todo o momento. Não queremos ser excluídos como excluímos outros por não gostar justamente do que fingimos gostar. Por mais que essa idéia soe destoante pode ser verificada quando nos abrimos para nós mesmos. Afinal de contas, se eu não tivesse que vestir essa máscara todos os dias e ocultar quem eu realmente sou, quem eu seria?

Parece fácil se não levarmos em conta que estamos falando de uma vida de dualismos. Eu gosto de pagode, mas finjo gostar de jazz, acho o Van Damme incrível, mas conto que meu ator favorito é o Jack Nicholson, apesar de achar bacana a menina linda com quem eu saio, eu gosto mesmo é da feia que eu não teria coragem de levar nem até a esquina, sempre quis ser biólogo, mas fiz medicina para agradar mamãe e papai, sou gay, mas ninguém sabe.

Não haveria problemas maiores se soubéssemos respeitar o outro como ele é, mas o outro como ele é esbarra naquilo que a gente inventa que não é.

E de quem é a maior felicidade ou mesmo a maior infelicidade? Daquele que vive intensamente o que sente, o que ama, mas não entra para a lista da festa de sábado ou aquele que mente descaradamente e pode conviver em paz nas reuniões de família?

Quem tiver a resposta, me diga.

Pertencer é um dos sentimentos mais urgentes que se tem na vida – Clarice Lispector.

Obs: Leiam “O Médico e o Monstro” de Robert Louis Stevenson e “Judas, o Obscuro” de Thomas Hardy.

sexta-feira, 9 de março de 2007

E Música...

E essa música do Paulinho da Viola não me sai da cabeça: "Não importa mais o que foi perdido, importa apenas o seu sorriso e nada mais..."

Irreversível

De tanto falarem deste filme francês, do diretor Gaspar Noé, fui conferir, apenas em DVD há algum tempo atrás. O filme trás um elenco de peso: Monica Bellucci, Vicent Cassel e Albert Dupontel. Quem não assistiria? Com um título desse, com um elenco soberbo e francês, cult, com críticas mezzo boas, mezzo bem ruins...só conferindo.

O primeiro filme de Noé, "Sozinho contra todos" de 1998, só passou aqui pelo Brasil, em salas e festivais obscuros, mas já neste filme, o diretor mostrou a que veio: cenas pesadas, que o espectador assíduo de filmes norte-americanos nem sonha ver.
Irreversible não é diferente, ele pode ser uma pedra no sapato, um soco no estômago de muita gente. Em sua primeira exibição, no festival de Cannes, em 2002, arrancou dos críticos o que deve ter soado como elogios: "Repulsivo!", "Doentio!", "Gratuito". Pois bem, Irreversível é tudo isso e pelo mesmo motivo, no mínimo, merece atenção.

A história é contada de trás pra frente, sem cortes, sem trilha sonora, o filme é seco. De início, assistimos Albert Dupontel esfacelar o rosto de um homem com um extintor de incêncio, quando digo assistimos, toma-se literalmente ao pé da letra, sem nenhum glamour, e com barulhos curtos. Chega a ser tão cruel quanto no filme do polonês Kieslowski, "Não Matarás", quando o assassino mata com uma pedra na mão e muitas pedradas na cabeça. Mas, o cruel ainda está por vir no filme de Noé.

Durante dez minutos sem cortes, assistimos a cena de estupro, dolorosamente, com uma câmera parada, mais ou menos com a intenção de ter sido esquecida ali para nos mostrar o quão cruel é para a vítima de estupro, tal ato.

Noé força os sentidos do público, mas na verdade quer fazer uma fábula sobre o destino. A montagem ao contrário casa com uma frase que é dita tanto no início quanto no fim do filme: "O tempo destrói tudo". A cada retrocesso no tempo, a história vai ficando mais leve, feliz, o que acaba impondo a idéia da impotência, e de tristeza, diante do destino dos personagens. A cada cena que passa, o filme pergunta por que as coisas não aconteceram de outra forma, por que não tomaram outro rumo, por que nós somos vítimas do destino? O tempo é o inimigo, o destino destrói tudo. O tempo é irreversível. E quem tem a resposta?

Este não é o primeiro, nem o último filme que vai escandalizar o público, virão outros.
Na minha modesta opinião, vale cada segundo, porque a violência nunca é gratuita e só em filme de Hollywood é mascarada.

A Era da Razão e a Explicação de Atos Bárbaros

Toda vez que ocorre um crime hediondo que estampa todas as capas de revistas e todas as manchetes de todos os jornais, como estupro, assassinato, matricídio, parricídio, abuso contra crianças e outras atrocidades, sempre existe alguém, ou, sempre existem muitos que pretendem explicar o acontecimento. Essas pessoas em geral, usam de artimanhas fáceis, como os milhares de livros na estante que também pretendem ter a definição e explicação de todos os atos humanos.
Alguns destes livros culpam a genética, outros, a infância horrorosa do(s) algoz (es), outros, vão além e juntam tudo no mesmo pacote para presente.
Estes livros se baseiam em uma única coisa: a razão. Sempre que algo que não compreendemos e nos assusta acontece, temos que tentar explicar com a nossa razão de “seres-humanos espetaculares” que somos, e TEMOS que encontrar respostas.
E algumas pessoas, a grande maioria, concordam que eu deveria pensar da mesma maneira, porque eu passei, passo e vou continuar passando meus dias, estudando comportamentos de seres humanos. E mais: eu deveria ter a obrigação de compreender e explicar para os “leigos” porque cicrano fez tal coisa com beltrano.
Pois bem, penso diferente da maioria dos estudiosos: Não entendo muita coisa, muita coisa me escapa, a minha razão é limitada, porque não tenho só razão dentro de mim. Como ser humano também me choco e me espanto pelas barbaridades que parecem banais e cotidianas. Posso tentar explicar, como psicanalista, posso determinar que alguém matou o pai, porque realmente teve uma infância marcada por sofrimento, dor, perdas, traumas e etc. Posso também, recorrer à Psicologia Social e suas teorias para concordar que àquele sujeito determinado não tinha voz no grupo, não tinha ideais, era manipulado e um dia se cansou.
Mas, a verdade, é que minha única explicação para este tipo de coisa é: não sei, não o conheço, não posso explicar. Por que haveria de saber? Porque a nossa sociedade é tão cartesiana e positivista a ponto de querer tudo de uma maneira fácil, como num livro de auto-ajuda? Os cartesianos e positivistas esquecem de uma particularidade, que é a particularidade do próprio sujeito que cometeu o determinado ato. Não somos iguais. Uma explicação disto: Muitos apanham, são humilhados e sofrem de maus tratos quando crianças, mas isto não é uma condição universal para que todos eles se tornem assassinos ou delinqüentes quando adultos.
Mais ainda, eu sei que as pessoas precisam de explicações para atos que as assustam, porque lhes conferem um pouco mais de segurança, de conforto num mundo que é a encarnação da atrocidade.
Se quiserem tão detalhadamente impor razões para todos os comportamentos humanos, então peço, imploro, que primeiramente expliquem detalhadamente o mundo que vivemos
.
Este texto foi publicado originalmente no já extinto Plano B.

Início da tentativa

Tropeçando em mim mesma, me transformando num emaranhado de qualquer coisa que não tem nome, procurando, implorando palavras, ruminando idéias. Isto é apenas uma tentativa de comunicação - comigo mesma - e que venham os outros, se os outros quiserem.